Exclusão do badminton dos Jogos da Commonwealth revolta federações
Medida liga sinal de alerta para futuros torneios esportivos

“Inesperado”, “amargo”, “decepcionante”, “chocante”, “triste”…essas foram apenas algumas palavras utilizadas por diferentes entidades e pessoas para definir o choque da exclusão do badminton na próxima edição dos Jogos da Commonwealth de 2026, em Glasgow, na Escócia. Toda comoção e surpresa que a decisão causou pode ser explicada pelo fato de o esporte de raquete mais rápido do mundo ser figurinha carimbada no evento desde 1966.
Antes de dar continuidade ao raciocínio, acredito que seja apropriado dedicar dois ou três parágrafos deste texto para explicar a você leitor ou você leitora o que é esse torneio, pois praticamente ninguém em terras tupiniquins dá a mínima por motivos de: o Brasil não participa. Resumidamente, os Commonwealth Games são os Jogos Olímpicos dos países que compõem a Commonwealth, um grupo formado por 56 Estados soberanos, principalmente ex-territórios do Império britânico.
Disputado a cada quatro anos, o evento nasceu em 1930 e reúne nações como Inglaterra, Austrália, África do Sul, Singapura, Canadá, Índia e tantas outras. Para os países que participam, os Jogos da Commonwealth são um evento relevante, pois colocam frente a frente inúmeras potências esportivas em dezenas de modalidades.
Olhando para o badminton, é uma oportunidade para indianos, australianos, ingleses, canadenses, singapurianos e malaios disputarem uma competição de alto nível sem a interferência de potências como China, Coreia do Sul, Japão e Dinamarca. Além disso, o evento carrega consigo uma certa rivalidade entre as ex-colônias britânicas que não se apagaram com o tempo.
Acho válido acrescentar que o badminton é um dos poucos esportes que sempre enviou atletas de elite para competir, tanto que uma das grandes queixas e dúvidas sobre o evento é justamente a participação considerada baixa de estrelas de diferentes modalidades envolvidas na programação.
Retomando o assunto polêmico, os próximos Commonwealth Games seriam um reencontro entre os badistes dessas nações e um termômetro para os Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 2028, mas a comunidade levou um inesperado balde de água fria. Entre as edições de 2022 e 2026, o número de esportes incluídos na programação foi de 20 para somente 10, sendo o badminton uma das modalidades guilhotinadas.
O chefão dos Jogos da Commonwealth na Escócia, Jon Doig, não explicou os motivos de o badminton ser excluído - e duvido que vá -, que nasceu em uma colônia britânica (Índia) e ganhou os moldes atuais na Inglaterra. No entanto, a sede dos Jogos de 26 pareceu uma batata quente. O evento foi originalmente programado para Victoria, mas o estado australiano desistiu de ser anfitrião devido ao aumento dos custos. A Malásia, por sua vez, considerou assumir o bastão, mas também se retirou pela dor de cabeça financeira que traria.
Após as duas recusas, a bomba caiu no colo de Glasgow, mas o governo escocês só aceitou fornecer apoio em caso de uma edição reduzida e economicamente mais viável, que foi o que aconteceu. Para se ter ideia do buraco sem fundo, os responsáveis pelos Commonwealth Games estão com seríssimas dificuldades até para determinar uma sede para a edição centenária do evento, que ocorrerá em 2030.
Para não deixar nenhuma ponta solta, os Jogos, que ocorrerão de 23 de julho a 2 de agosto de 2026, contarão com 10 esportes em quatro locais diferentes: atletismo, natação, ginástica artística, ciclismo de pista, netball, levantamento de peso, boxe, judô, boliche e basquete 3x3. Algumas modalidades que foram excluídas: tênis de mesa, squash, triatlo, badminton, hóquei na grama, wrestling e críquete.
Mundo do badminton em chamas
Em meio às dificuldades para manter os Jogos da Commonwealth vivos, atrativos e competitivos, os responsáveis pelo evento compraram uma briga desnecessária com um dos esportes que mais levam a sério o torneio. Foram questões de minutos para que as federações de badminton de diversos países condenassem a decisão de retirar a modalidade da programação pela primeira vez em seis décadas.
“É chocante e um grande revés para os esportes indianos, com quase 40 medalhas em risco devido aos eventos cancelados. Isso não é apenas uma perda para os esportes e atletas, parece mesmo uma conspiração para marginalizar o crescente potencial esportivo da Índia na região. A federação protesta firmemente e entrará em contato com todas as autoridades relevantes, bem como os mais altos níveis do governo, para defender o futuro dos esportes indianos”, declarou o secretário-geral da Associação de Badminton da Índia (BAI), Sanjay Mishra.
Visivelmente consternada com a situação, o dirigente asiático não descartou a possibilidade de um futuro próximo solicitar um boicote geral da Índia ao evento esportivo, pois as modalidades mais populares do país foram excluídas. Além disso, Nova Delhi é uma nação que coloca os Jogos da Commonwealth em um patamar altíssimo e faz poucas distinções se é um torneio relevante ou não.
As Associações de Badminton da Inglaterra, da Escócia e da Austrália declararam que estão “decepcionadas” com os organizadores. Os ingleses, os australianos e os escoceses lamentaram pelos seus próprios atletas, pois muitos deles já estavam se preparando especificamente para competir em Glasgow.
“Embora sempre soubéssemos que decisões difíceis precisavam ser tomadas devido ao programa bastante reduzido, sempre esperamos que um dos esportes de participação mais populares, inclusivos e acessíveis do mundo fosse incluído em Glasgow-2026. Esta foi uma pílula amarga de engolir para nossos atletas que já haviam mudado o foco para 2026, mas agora precisamos encontrar uma maneira de continuar a apoiá-los enquanto nos reagrupamos e iniciamos nossa campanha em direção a LA-2028”, declarou Tjitte Weistra, CEO da Badminton Australia.
Existe a possibilidade de os organizadores reavaliarem essa decisão? Existe, como já aconteceu em edições anteriores envolvendo outras modalidades, principalmente após queixas das Índia, mas as chances vão aos poucos caindo das mãos conforme o tempo vai passando. Contudo, uma coisa é certa: isso vai dar pano pra manga.
Como isso afeta o Brasil?
Felizmente, o impacto das decisões britânicas não deverá ter um efeito imediato em solo brasileiro ou no continente sul-americano, mas também seria um equívoco das entidades competentes deixar essa repentina exclusão do badminton cair em completo esquecimento ou acreditar que foi uma mera coincidência.
O mais perto que temos dos Jogos da Commonwealth são os Jogos Pan-Americanos, igualmente disputados a cada quatro anos e que envolvem dezenas de países do continente, inclusive alguns que disputam os dois eventos esportivos. A próxima edição será em 2027, em Lima, e não há, ao menos até o momento, nenhuma surpresa em relação aos esportes selecionados.
Ao contrário do “nobre primo” europeu, o Pan-Americano elevou a quantidade de modalidades em comparação com os eventos anteriores. A edição passada, ocorrida em 2023, em Santiago, 39 esportes marcaram presença e o campeonato estabeleceu um novo recorde de atletas participantes, com quase sete mil competidores. Além disso, em matéria de competitividade, o torneio do continente americano supera com louvor o seu quase homólogo britânico.
Ainda não há muitas informações sobre o que acontecerá para a edição de 2031, mas a disputa pela sede de 2027 foi marcada por algumas candidaturas que não deram prosseguimento em razão das dificuldades financeiras. Isso te lembra algo já citado nesse texto? A cidade de Barranquilla, na Colômbia, chegou a colocar a mão direita inteira e alguns dedos da esquerda para ser a anfitriã do Pan-27, mas o castelo desmoronou por completo pelas crises de segurança e financeira do município. Ou seja, assim como Glasgow, a capital peruana recebeu a missão de sediar novamente a competição de forma inesperada.
Uma coisa que é necessário levar em conta: se os países europeus estão com dificuldades para organizar os Commonwealth Games, que têm menor magnitude em relação ao Pan-Americano, imaginem só as nações sul-americanas e centro-americanas. O evento envolve muito dinheiro, infraestrutura, ajuda e pessoas, então, não é qualquer coisa receber milhares de atletas de uma vez só em seu país.
Não estou cravando absolutamente nada, mas Glasgow não deixa de ligar um sinal de alerta de que “tudo é possível”, principalmente em uma região do planeta tão instável em questões econômicas e políticas. Não duvidaria que as chances de enxugar de alguma forma os Jogos Pan-Americanos já tenham sido discutidas em alguma oportunidade.
Desde 1995 no Pan, o badminton não é o esporte mais popular do continente, acredito que sua sobrevivência em um possível corte da lista de modalidades dependerá da nação anfitriã. A Escócia, por sua vez, não é um país muito ligado a modalidade, então acredito que sua ausência reduziria custos e não mexeria com os corações da população local.
Não acredito que o badminton seria guilhotinado tão facilmente, mas a frieza da organização dos Jogos da Commonwealth mostrou que tudo está em jogo quando é necessário reduzir custos. Em virtude disso, as entidades que regem a modalidade na região precisam se manter atentas para evitar quaisquer imprevistos.
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